A segurança jurídica é um princípio de direito de extrema relevância, já que
traduz a ideia de proteção, de garantia, de confiança, de não surpresa dos
contribuintes em relação ao comportamento da administração pública.
Trata-se de um valor fundamental da Constituição Federal de 1988, que
encontra seu abrigo já no seu preâmbulo. Segurança jurídica, explica Leandro
Pausen, “é a qualidade daquilo que está livre de perigo, livre de risco,
protegido, acautelado, garantido, do que se pode ter certeza ou, ainda, daquilo
que se pode ter confiança, convicção” (Direito Tributário – Constituição e
Código Tributário à luz da Doutrina e da Jurisprudência, 13ª ed., 2011, Livraria
do Advogado, p. 914/915). Essa breve introdução tem o objetivo de demonstrar que
a relação fisco-contribuinte é pautada firmemente na segurança jurídica.
Sempre que a ação do Estado se desvie do comportamento que lhe é inerente ou
que dele se espera, o cidadão contribuinte deve buscar o restabelecimento do
equilíbrio dessa relação, socorrendo-se, se necessário, no Poder Judiciário.
Nesse sentido, recentemente, a Justiça Federal do Paraná produziu relevante
decisão em que reconheceu ser arbitrária a iniciativa da administração pública
de rever um parcelamento de débitos, fazendo-o dez anos após a sua consolidação
e dois anos após a sua integral quitação, com o intuito de cobrar um suposto
“saldo residual”.
Embora seja certo, de um lado, que a administração pública tem o direito de
rever seus próprios atos, quando eivados de ilegalidade, de outro, isso depende
de efetiva demonstração do erro e não pode ocorrer em prazo indeterminado, eis
que, assim agindo, viola-se o princípio da segurança jurídica e de seus
corolários. Com propriedade, afirmou o juiz federal Vicente de Paula Ataide
Junior ao julgar o caso:
“Ora, se o valor foi fixado na consolidação datada de 01/03/00 abrangendo
todos os débitos anteriores é sobre esse montante e a partir dessa data que a
Administração Pública poderia efetuar revisão. Como, pelo princípio da segurança
jurídica, não se pode admitir que os débitos tributários sejam alterados pela
Administração Pública indefinidamente, destaco a importância dos cinco anos
fixados como prazo decadencial.” (MS nº 5052401-05.2011.404.7000/PR)
Na mesma decisão, e com base no parecer do Ministério Público Federal,
privilegiou-se a boa-fé do contribuinte: “O contribuinte que paga uma dívida,
durante tanto tempo e de boa-fé, referente a fatos ocorridos há mais de dez
anos, não pode, ao findar do parcelamento, ser surpreendido com a informação de
que a administração pública incorreu em erro no apurar de seu saldo devedor e
por isso não está quite com as obrigações tributárias, pois tal fato macularia
de juridicamente inseguro o sistema instituído pela Lei 9.964/00”.
Em outra situação, esse mesmo quadro de insegurança jurídica se repetiu.
Tratou-se de contribuinte que realizou o pagamento de débitos com os benefícios
do Refis da crise (Lei nº 11.941/09). Assim, para obter os descontos de multa e
juros previstos na Lei, ele optou pela desistência da discussão administrativa
que mantinha, emitiu o DARF diretamente do site da Secretaria da Receita Federal
do Brasil e quitou sua dívida.
No entanto, foi surpreendido por um “aviso de cobrança”, referente a uma
suposta diferença existente no valor da multa e dos juros pagos. Ao examinar o
caso, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, valendo-se dos princípios da
proteção da confiança e da boa-fé, reconheceu a ilegalidade da cobrança da
diferença pretendida. A desembargadora Luciane do Amaral Correa Münch foi a
relatora do acórdão, de onde se extrai a seguinte passagem:
“Com efeito, como já dito, as DARF’s foram emitidas pelo próprio Sistema da
Receita Federal, não tendo o contribuinte qualquer ingerência sobre o seu teor,
tendo adimplido o tributo na mais absoluta boa-fé. Por essa razão, se mostra
descabida a alegação de que tenha adotado critério de cálculo equivocado, quando
em verdade os critérios foram fornecidos pela própria impetrada.” (AMS nº
5012285-88.2010.404.7000/PR)
Essas decisões prestigiam a segurança jurídica, os valores que dela decorrem
ou se desdobram (tais como a boa-fé, a confiança, a estabilidade das relações
jurídicas etc.) e evidenciam a necessidade de coerência da administração pública
na prática de seus atos.
by Flávio Zanetti de Oliveira, advogado, é mestre em Direito Tributário pela PUC-SP.
Disponível em: http://www.gazetadopovo.com.br/vidapublica/justica-direito/artigos/conteudo.phtml?tl=1&id=1320537&tit=O-principio-da-seguranca-juridica-e-o-pagamento-de-tributos. Acesso em: 10 fev. 2013.
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