Além de inédita, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de condenar à
prisão um senador da República - Ivo Cassol, de Rondônia - reabriu a questão da
competência da Alta Corte para determinar a cassação dos mandatos de
parlamentares que tiver condenado. Cassol foi apenado a 4 anos, 8 meses e 26
dias em regime semiaberto por fraudar licitações quando prefeito de Rolim Moura,
no seu Estado. A mesma pena foi aplicada a dois de seus então colaboradores.
Eles deverão perder os cargos públicos que eventualmente exercerem. Mas Cassol
só será privado de seu mandato se a maioria absoluta dos seus pares, em votação
secreta, assim resolver. Para o presidente do tribunal, Joaquim Barbosa, a
diferença de tratamento inverte a regra segundo a qual "quanto mais elevada a
responsabilidade, maior deve ser a punição".
Configurou-se, de qualquer forma, uma reviravolta. No ano passado, por 5
votos a 4, o STF entendeu que a Câmara deveria cassar compulsoriamente os
mandatos dos deputados João Paulo Cunha, José Genoino, ambos do PT, Pedro Henry,
do PP, e Valdemar Costa Neto, do PR, condenados no processo do mensalão. Desta
vez, por 6 votos a 4, o Supremo deixou para o Senado a decisão final. A mudança
resulta da nova composição do tribunal, com o ingresso de dois novos ministros,
Teori Zavascki e Luís Roberto Barroso. Eles transformaram em maioria a minoria
de então, juntando os seus votos aos dos colegas Cármen Lúcia, Dias Toffoli,
Ricardo Lewandowski e Rosa Weber. Do outro lado, mantiveram as suas posições
Joaquim Barbosa, Celso de Mello, Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello. Por
impedimento técnico, o ministro Luiz Fux, que pensava como eles, não pôde
participar do julgamento de Cassol.
Barroso disse "lamentar" que a prerrogativa do Legislativo de cassar mandatos
esteja na Constituição. "Mas está aqui", argumentou. "A Constituição não é o que
eu quero, é o que eu posso fazer dela." Zavascki, por seu turno, afirmou que
eventual incongruência da Constituição - como a que parece existir no artigo 55,
que trata da matéria - "não é problema nosso". Para Barbosa, no entanto,
"estamos aqui para interpretar a Constituição". Na mesma linha, Mendes disse que
"o sujeito condenado exercendo mandato parlamentar é fórmula jabuticaba: só
existe no Brasil". Não está claro, de todo modo, se a nova decisão prevalecerá
sobre a anterior no caso dos deputados do mensalão. É o que se começará a saber
a partir desta semana, quando o STF retomará o julgamento dos primeiros embargos
à condenação dos réus.
Se os recursos forem admitidos - contra a posição, já manifestada, de Joaquim
Barbosa -, poderão cair as condenações por formação de quadrilha de diversos
réus da ação penal, entre eles o ex-ministro José Dirceu, o ex-tesoureiro do PT
Delúbio Soares, o publicitário Marcos Valério e o deputado Genoino, tomadas por
5 votos a 4. (O regimento do STF prevê a acolhida de embargos infringentes a
sentenças em que pelo menos quatro ministros votaram a favor dos acusados,
embora a lei tenha extinguido o recurso.) Isso porque, no julgamento de Cassol,
Zavascki e Barroso o inocentaram do crime de quadrilha. Como o Estado destacou
sexta-feira, Barroso acompanhou o voto do colega Dias Toffoli, o qual, para
absolver o senador, repetiu os argumentos que usara no processo do mensalão.
Segundo ele, acompanhando a posição da ministra Rosa Weber, "ocasional concerto
de vontades para a prática de crimes" não configura quadrilha.
Daí não se infere que os novos ministros necessariamente replicarão os seus
votos em relação a esse item, na hipótese de a maioria da Corte divergir do seu
presidente quanto à admissibilidade dos embargos. É de lembrar ainda que os
ministros Gilmar Mendes e Celso de Mello, que haviam condenado nove réus do
mensalão por formação de quadrilha, só absolveram o senador porque não chegaram
a quatro os acusados das fraudes de Rondônia. Não deixa de ser significativo, de
qualquer maneira, que o ineditismo do ato do STF, ao mandar para a cadeia um
senador, tenha dividido a cena com a questão das cassações e o presumível efeito
da sentença para o desfecho do mensalão - do qual, no dizer de Mendes, dias
atrás, o tribunal continua "refém".
Disponível em: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,o-stf-inova-e-volta-atras-,1062873,0.htm. Acesso em: 11 ago. 2013.
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