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quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Bisbilhotice Geral ou Quebra de Sigilo Fiscal?

Em especial, na atual conjuntua eleitoral, somos submetidos aos mais diferentes abusos da máquina governamental. A mais recente, a quebra do sigilo fiscal imotivada, isto é, invasão criminosa a dados pessoais de vários cidadãos pela Receita Federal, estilo Receita-gate.



Algo que choca toda uma nação por sua imensa gravidade similar a uma tortura mental que nos remete a mais insegurança, desproteção e vulnerabilidade incomensuráveis. Indignação geral e não aceitação desse tipo vil de violação pelo poder e devassa a privacidade. Claro, as responsabilidades com cunho eleitoral ou não só podem ser atribuídas ao final de toda investigação pela Polícia Federal e Ministério Público.
Assim, vale lembrar que a proteção ao sigilo fiscal encontra na matriz constitucional sob o manto do princípio da inviolabilidade da intimidade de dados pessoais, inteligência do artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal de 1988, além do direito à privacidade. Ainda no que diz com a tentativa de clarificação do sigilo fiscal, na legislação infraconstitucional, encontra-se plasmado no artigo 198 do Código Tributário Nacional (CTN), cabendo tão somente algumas exceções previstas pelo artigo 198, parágrafo único, do CTN. Acresce-se, ainda, a Lei Complementar 104/2001.
Por outro lado, e da mesma forma constitucionalmente previsto, está o dever de fiscalização do Estado, no artigo 145, parágrafo 1º da Carta Federal. Já no que tange ao sigilo bancário sua regulamentação se dá pela Lei 4 .595/1964, artigo 38 e suas alterações pela Lei Complementar 105/2001.
Vinculada a esta ideia, que - como visto - já transparece situação de contraposição entre o respeito ao sigilo fiscal e o dever de fiscalização do Estado, verifica-se ressaltar nesse ponto específico que haja ponderação legal de valores de forma razoável e justa pelos entes públicos. Dito de outro modo, a clara colisão de dois interesses públicos, quais sejam, o de mais bem investigar e apurar irregularidades e o de preservar o segredo de justiça - sigilo fiscal e bancário - não se anulam, mas busca-se o ponto exato de equilíbrio de justiça na sua aplicabilidade, sem nenhum tipo de banalização ou extrapolação de qualquer teor.
Para além das conexões já referidas, situa-se o entendimento que o direito ao sigilo fiscal não é absoluto. Em verdade, na esteira do que averbou Hugo de Brito Machado Segundo - cujo pensamento também aqui recolhemos na íntegra: “a regra é o respeito ao sigilo, sendo exceção a sua quebra, em face de circunstâncias que justifiquem a atribuição de maior peso aos princípios que justificam a fiscalização que aos que protegem a intimidade do fiscalizado” [Processo Tributário. São Paulo: Atlas, 2006]
O que se percebe, em última análise, na controvérsia apontada, não é possibilidade da quebra do sigilo, mas sim quem pode fazê-lo. Eis o ponto chave de toda discussão: quem, como, por quê o faz?
Tão somente com autorização judicial fundamentada pode-se permitir excepcionalidade de sua quebra como estabelece o artigo 5º, inciso XII, da CF/88 e já pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ):
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. PEDIDO DE INFORMAÇÕES. RECEITA FEDERAL. MULTA. I - O artigo 197 do CTN indica a possibilidade de quebra de sigilo bancário, mas tal possibilidade não mais pôde vigorar, em face do princípio da privacidade, constante dos incisos X e XII do art. 5º da Constituição Federal de 1988. II - A determinação da quebra de sigilo bancário deve ser feita por meio de decisão judicial fundamentada, à consideração de que a inviolabilidade de dados consagrados como direito à privacidade é constitucionalmente garantido, nos termos dos supracitados dispositivo constitucional. III - Recurso especial improvido. (REsp 705.340/PR, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 16.02.2006, DJ 06.03.2006 p. 198).
Trata-se de competência privativa do Poder Judiciário, ou seja, matéria da chamada reserva jurisdicional conforme asseveram várias jurisprudências do Supremo Tribunal Federal (STF), por exemplo, no (MS 27483 REF-MC / DF -Relator: Min. Cezar Peluso, DJe-222, Divulg. 20-11-2008, Public. 21-11-2008) entre outros.
Analisando as decisões do STF, constatamos que o entendimento majoritário é no sentido de que tanto o sigilo fiscal quanto o bancário é relativo e podem ser quebrados quando necessário mediante ordem judicial.
De qualquer modo, acreditamos - parafraseando aqui a lição de Ingo Wolfgang Sarlet - que a sociedade não pode ser açoitada de lesões aos direitos fundamentais e muito menos do ultraje e desrepeito às garantias mais elementares do cidadão livre em um Estado Democrático de Direito como o Brasil. [Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado. 2008].
É isso que esperamos e exigimos, na práxis, que haja força normativa e vinculativa da Carta Magna vigente albergada pelo princípio maior da dignidade da pessoa humana, que lhe dá a consideração de ser cunhada por uma Constituição da pessoa humana!
Voltando ao escândalo do Receita-gate que nos abala com esses vazamentos irregulares, por fim, cabe questionar: estratégia eleitoral ou incompetência da gestão pública federal? Ou ainda, a fragilidade da aplicação da lei de forma igual?
Autoria de quem e que medidas de segurança serão implementadas afim de evitar que esse crime se repita? Eis o que toda a sociedade tem o direito de saber.
Diante do exposto, ainda que sumariamente, vale a pena conferir a entrevista/ vídeo - do Programa Entre Aspas - da Globonews, Mônica Valdvogel, verdadeira aula por três constitucionalistas da maior grandeza - Prof. Dr. Luís Roberto Barroso, Prof. Pedro Serrano e Prof. Oscar Vilhena Vieira.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

domingo, 8 de novembro de 2009

Princípio da dignidade da pessoa humana


O princípio da dignidade da pessoa humana é considerado o princípio fundamental maior constitucional previsto em seu artigo 1º, inciso III, da Carta Magna de 1988.

Eis abaixo seu conceito nas suas mais diversas dimensões segundo o constitucionalista Ingo Wolfgang Sarlet:


"O caráter multidemensional da dignidade da pessoa humana, considerando sua dimensão ontológica (embora não necessariamente biológica), sua dimensão histórico-cultural e sua dupla dimensão (ou função) negativa e prestaional, ao que se poderia ainda gregar a igualmente dupla dimensão objetiva e subjetiva da dignidade, na condição de princípio e norma embasadora de direitos fundamentais, tema que, embora não exatamente desenvolvido sob este rótulo (dimensão objetiva e subjetiva) será abordado mais adiante.
Além disso e a partir das considerações já tecidas, embora a abertura e o caráter multidimensional da dignidade da pessoa humana (e também justamente em função disso) a dignidade não tem sido e não é necessariamente uma fórmula vazia e meramente retórica, ainda que assim muitas vezes tenha sido tratada, aspecto que voltará a ser objeto de nossa atenção.
Por outro lado, encerramos esta etapa do nosso estudo ousando formular porposta de conceituação (jurídica) da dignidade da pessoa humana que, além de reunir a dupla perspectiva ontológica e instrumental referida, procura destacar tanto a sua necessária faceta intersubketiva e, portanto, relacional, quanto a sua dimensão simultaneamente negativa (defensiva) e positiva (prestacional). Assim sendo, temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos."¹


¹ SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 63