domingo, 15 de maio de 2011

A dignidade da morte

*Recomendo a leitura deste bem escrito artigo.

EUDES QUINTINO DE OLIVEIRA JÚNIOR**
A Constituição Federal brasileira, em seu artigo 5º, III, consagra o princípio da dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito. A inserção desse princípio no texto constitucional atendeu aos reclamos da Declaração Universal dos Direitos do Homem, homologada pela resolução da Assembléia Universal das Nações Unidas, que, em seu artigo I, proclama in verbis:
“Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito da fraternidade”.
A reafirmação da confiança na raça humana na Carta foi calcada na dignidade e no valor da pessoa humana, na igualdade e no respeito para que o homem possa atingir suas mais altas aspirações, num regime de liberdade de pensamento e realizações coletivas tomadas de comum acordo pelo grupo social.
O homem é tutelado pelo Estado desde sua concepção. Seria uma modalidade do welfare state americano. Durante a vida intra-uterina o feto goza de toda proteção e se for molestado por práticas abortivas, que não aquelas consideradas legais, o agente responderá pelo ato criminoso. A própria mãe, sob influência do estado puerperal, vier a provocar a morte do filho, será considerada infanticida. O nascimento provoca o acolhimento na sociedade e a inserção do menor nas medidas protetivas da infância e juventude. Com a maioridade, o cidadão é revestido de todos os direitos conferidos no texto constitucional e passa a ser um colaborador do desenvolvimento social e econômico da coletividade, assim como desenvolve estratégias para sua realização pessoal, familiar e profissional. Finda o período laboral, alcança a aposentadoria e se filia ao Estatuto do Idoso, que confere a ele um plus diferenciado de direitos.
A morte é consequência da vida. O Estado, continua sua função tuteladora e, em razão de seus compromissos éticos e religiosos, somente admite a morte com o cumprimento do ciclo natural, sem qualquer chance de permitir a interrupção precoce da vida em situação de irreversibilidade da saúde do paciente.
A sociedade, no entanto, caminhando lado a lado com a biotecnologia e a biotecnociência, com o consequente alargamento cultural de vários institutos até então não repensados, sofre uma transformação em sua própria estrutura, abre espaços para discussão e insere o tema relacionado com a morte, vista sob o prisma de sua dignidade, a mesma que foi conferida à vida.
Os mecanismos de prolongamento da vida e da interrupção do sofrimento do paciente ocupam destaque nos debates éticos, bioéticos, envolvendo médicos, juristas, psicólogos, filósofos, religiosos e outros profissionais que de uma forma ou outra dedicam sua parcela de contribuição ao tema. Sem falar ainda do envolvimento popular nas camadas mais simples da sociedade.
Até mesmo o Supremo Tribunal Federal foi chamado recentemente a decidir a respeito do início da vida humana quando da decisão envolvendo a utilização de células-tronco embrionárias para fins de pesquisa e terapia. E agora decidirá a respeito do aborto de feto anencefálico. São temas que, ao mesmo tempo que tangenciam a vida, alcançam a morte.
A distanásia, a eutanásia, a ortotanásia e o suicídio assistido são temas que frequentam a vida do cidadão brasileiro e constantemente acirram discussões fomentando a busca de uma decisão que seja coerente, correta e representativa do anseio popular.
Em razão da decisão judicial italiana permitindo a realização da eutanásia na jovem Eluana Englaro, o governo italiano criou o dispositivo legal conhecido por “testamento vital ou biológico”, permitindo à pessoa, no gozo de suas prerrogativas mentais, procurar um cartório e elaborar um documento que especifique o tratamento que gostaria de receber em caso de doença terminal. Com a mesma finalidade, o vizinho Uruguai aprovou a “lei de vontade antecipada”.
Feitas tais considerações que envolvem a apresentação sucinta do tema morte, resta aguardar a solução legislativa que vai definir a maneira correta da interrupção da vida, com um perfil próprio e adequado à nossa cultura., A proposta de é toda relevante e faz abrir um novo arsenal de informações para a sociedade brasileira, diante de polêmico tema. A dignidade da pessoa humana vai ser levada até sua morte, dogma constitucional inarredável da cidadania plena.

Você doaria os órgãos de seu parente?*
Você denunciaria?*

**Eudes Quintino de Oliveira Júnior – Promotor de Justiça aposentado SP. Mestre em Direito Público. Doutor em Ciências da Saúde. Doutorando em Direito público. Pós-doutorando em Ciências da Saúde. Reitor do Centro Universitário do Norte Paulista. Advogado. Professor de Processo Penal, biodireito e bioética.

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