domingo, 15 de janeiro de 2012

O Judiciário em novo momento

Se por um lado a disposição do presidente do Supremo em propor uma nova lei sobre as regalias da magistratura deve ser saudada como positiva, permanece a preocupação com as ações para reduzir os poderes do CNJ. Se isso efetivamente ocorrer, será um lamentável retrocesso na busca por uma Justiça que atue com mais presteza e transparência, em consonância com os anseios da nação
Não paira qualquer dúvida de que o Judiciário brasileiro experimenta desde os últimos meses de 2011 a mais grave crise de sua história, consequência fundamentalmente do corporativismo que se cristalizou na instituição. Com problemas internos profundos – falta de celeridade processual e a defesa de privilégios, para citar dois deles – a Justiça do Brasil parece não querer partilhar da necessidade que tem o país de passar a limpo as suas instituições públicas, de modo a adequá-las às atuais e reais necessidades da sociedade. A manifesta insatisfação de entidades representativas dos juízes com a atuação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que consideram estar extrapolando seus poderes de fiscalização, é um exemplo da falta de sintonia com a realidade.
Desde que a corregedora nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon, falou sem meias palavras da existência de bandidos de toga, os ânimos se acirraram, elevando a temperatura das discussões em torno da atuação e dos limites do CNJ. As investigações do conselho para apurar suspeitas de enriquecimento ilícito de magistrados e a concessão de benesses indevidas por tribunais colocaram, então, definitivamente em rota de colisão Judiciário e CNJ.
Pelo papel fundamental que desempenha na sociedade como um dos pilares da democracia, o Judiciário precisa superar o momento difícil que vive, deixando de lado posições anacrônicas que ainda subsistem em sua estrutura. Tanto isso é verdade que o próprio presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Cezar Peluso, anunciou dias atrás que irá enviar ao Congresso a proposta de uma nova Lei Orgânica da Magistratura. Muito embora o texto não esteja concluído, já se sabe que os juízes perderão, se aprovado, alguns benefícios e regalias considerados indefensáveis até mesmo por setores do próprio Poder. A intenção de Peluso, conforme o que foi noticiado, é dar andamento à matéria até o mês de abril próximo, quando vencerá seu mandato à frente do STF.
Se por um lado a disposição do presidente do Supremo em propor uma nova lei sobre as regalias da magistratura deve ser saudada como positiva, permanece a preocupação com as ações para reduzir os poderes do CNJ. Se isso efetivamente ocorrer, será um lamentável retrocesso na busca por uma Justiça que atue com mais presteza e transparência, em consonância com os anseios da nação.
Assim sendo, em 2012, o grande teste que terá pela frente o Judiciário será o julgamento no STF do mensalão, um escandaloso estelionato político urdido no primeiro governo do ex-presidente Lula. Em troca da garantia de apoio político no Congresso ao incipiente governo lulista, parlamentares da base recebiam um quinhão mensal. A “quadrilha”, como bem definiu o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, em seu libelo, era integrada por líderes petistas, a começar do ex-ministro José Dirceu, apontado como o mentor do golpe, parlamentares de diversos partidos, publicitários e banqueiros. No total, 38 são os acusados que sentarão no banco dos réus.
O ministro Joaquim Barbosa já concluiu o seu relatório condensando em 122 páginas nada menos que 233 volumes e 495 apensos que compõem o processo, totalizando 49.914 páginas. O documento e todos os autos do processo foram agora encaminhados ao ministro-revisor, Ricardo Lewandowski, que também irá formular seu relatório e voto. A partir daí, caberá ao presidente do STF marcar a data do julgamento em plenário, o que deve ocorrer até maio. Nas palavras do ministro Barbosa, o mensalão representa “uma ação de natureza penal de dimensões inéditas na história desta Corte” [O Supremo Tribunal Federal], o que por si só dispensa outros comentários sobre sua magnitude. Julgar a tempo para evitar a prescrição das penas e punir exemplarmente os mensaleiros que impingiram ao país a maior tramoia política da história é o que a sociedade brasileira espera. Varrer da vida pública os envolvidos no caso pode representar o divisor de águas entre a impunidade recorrente nos crimes cometidos por maus gestores e um novo patamar ético para a administração pública brasileira.

Disponível em: http://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/conteudo.phtml?tl=1&id=1212985&tit=O-Judiciario-em-novo-momento. Acesso em: 15 jan. 2012.


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