sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Precisamos tirar o direito ambiental da teoria, diz Milaré

O Brasil possui uma das legislações mais avançadas, no mundo, sobre direito ambiental, em termos de zelo e trato do Meio Ambiente. Porém, isso não é suficiente, o desafio do país é a implementação dessas leis. “Não adianta termos efetivamente uma legislação magnífica, se não temos pessoas ou instituições adequadamente pré-ordenadas para tirarem da teoria essa legislação magnífica”, avalia o jurista Édis Milaré, com exclusividade, para o Observatório Eco.
Édis Milaré, atualmente, é advogado na área ambiental, segmento pelo qual se interessou quando ainda era procurador de Justiça em São Paulo. Inclusive, durante 9 anos foi um dos formadores da estrutura do Ministério Público para atuar nas questões ambientais, e no campo dos interesses difusos e coletivos. Lembra que, na época, junto com outros colegas eram chamados de defensores românticos da Natureza, pelos demais membros do MP.
Formado pela Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie, com pós-graduação, em direito processual civil, pela USP (Universidade de São Paulo), Milaré aponta que antes da década de 80, o país era até “irresponsável”, em termos ambientais.
Em 1981 surgiu no país a primeira lei séria em matéria ambiental, a lei, 6.938/81, da Política Nacional do Meio Ambiente. “Começa a se implantar uma legislação adequada, sistemática, que hoje dá todos os instrumentos para que se possa fazer uma gestão, uma administração adequada do Meio Ambiente”, afirma. E completa, “mas, falta implementação, que efetivamente tudo isso saía da teoria e vá para o campo da concretude, da aplicação efetiva”, critica.
Negligência do Estado
Milaré é um dos primeiros autores a escrever no campo doutrinário sobre o tema ambiental. Ele reconhece que muito se avançou no segmento. “Nosso país não só ganhou em termos de uma legislação boa, mas também passou a ter uma consciência muito mais forte da necessidade de se proteger o Meio Ambiente”, e nessa defesa destaca a atuação do Ministério Público, e da própria Ordem dos Advogados do Brasil, que tem as suas Comissões de Meio Ambiente.
Para o professor, “os Estados estão se articulando para uma defesa mais eficaz do Meio Ambiente. Mas infelizmente, se deixa muito a desejar na implementação”.
Em sua opinião “o poder público deveria ser o primeiro ente a dar exemplo, porém é o que mais freqüenta o banco dos réus, por negligenciar o trato adequado com o Meio Ambiente”.
Ele comenta, relacionando ao assunto, o acidente ambiental, no início deste mês de agosto, ocorrido no Rio de Janeiro com a CSN (Companhia Siderúrgica Nacional), quando houve vazamento de óleo no rio que abastece a cidade do Rio de Janeiro.
“Como pode uma empresa desse porte não avisar um órgão ambiental, quando ela está emitindo poluentes em um rio que abastece quase que totalmente a comunidade do Rio de Janeiro? Isso é uma irresponsabilidade sem conta”, avalia Milaré.
Justiça e Ministério Público
Perguntamos ao jurista se falta no país segurança jurídica na área ambiental. Em sua opinião, “não falta. Mas, infelizmente não posso deixar de reconhecer que o nosso Judiciário é muito lerdo”. “Ainda não responde com a necessária eficácia os reclamos da comunidade, e isso não é só no âmbito ambiental”, completa.
Ele aponta que graças a nossa legislação processual, “em matéria ambiental há muitos meios de fazer com que as decisões sejam agilizadas”.
Lembra a importância das ações civis públicas propostas pelo Ministério Público, “que mesmo tendo as suas dificuldades, e todas as instituições tem. É uma instituição ímpar”, em sua opinião.
“A independência que a Constituição Federal dá ao MP, lhe permite até questionar o que o Executivo está fazendo nesse campo”, identifica. Outro ponto importante, para ele, é o fato de toda comarca ter um promotor, além do fato de não existir custas processuais ou pagamento de sucumbência nas ações civis públicas. São elementos que dão ao MP muito mais “articulação para cuidar da matéria ambiental”.
Avesso a mudanças
Édis Milaré é um dos redatores da lei de ação civil pública, lei 7.347/85 e revela preocupação com a tramitação do projeto de lei 5.139/2009, no Congresso Nacional, que altera esse instrumento.
“Não acho o momento apropriado para alterações na lei da ação civil pública. Quero deixar claro que não é porque fui um dos autores dessa legislação. Mas é um instrumento que vem funcionando bem, já está em vigor desde 85”.
Ele explica que tem “receio”, que a ação civil pública, após ser rediscutida no Congresso, resulte em um instrumento enfraquecido. “Tenho medo de um resultado pouco favorável, mas vamos acompanhar a matéria, e torcer pelo melhor”, pondera.
Quando perguntamos ao jurista sobre as mudanças no Código Florestal, Milaré, também se mostra receoso. “Existe um embate muito forte entre ambientalistas e a bancada ruralista, que está avançando em busca de áreas de expansão da agricultura”.
E cita o exemplo do “código ambiental de Santa Catarina, que classifica com um “desastre”. “Onde já se viu deixar de preservar as áreas de nascente, a mata ciliar”, reclama o jurista, que discorda da eliminação das áreas de preservação permanente, da reserva legal e outras conquistas que o Código Florestal já garante.
“Isso é muito sério, temos que ter cautela”, avalia Milaré que enfatiza a importância de acompanharmos atentamente esse tema, que irá refletir drasticamente em nosso futuro.



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