"Entendo que o dever da boa fé da Administração Pública, exige o respeito incondicional às regras do edital, inclusive quanto a previsão das vagas do concurso público. Isso igualmente decorre de um necessário e incondicional respeito à segurança jurídica como princípio do Estado de Direito." Com esse entendimento, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, obrigou o estado de Mato Grosso do Sul a nomear aprovados em concurso.
O voto de Gilmar Mendes foi acompanhado, na quarta-feira (10/8), por unanimidade, pelos ministros do Supremo. A corte entendeu que esses concurseiros têm, sim, direito à nomeação. O entendimento se deu em um impasse levado ao colegiado pelo estado de Mato Grosso do Sul, que questionava a obrigação da administração pública em nomear candidatos aprovados dentro no número de vagas oferecidas no edital do concurso público.
Antes do julgamento, o assunto teve sua Repercussão Geral reconhecida, tendo em vista a relação da matéria com o aumento da despesa pública. O ponto central de discussão do Recurso Extraordinário é se o candidato aprovado em concurso público possui direito subjetivo à nomeação ou apenas expectativa de direito.
Para o estado, só uma equivocada interpretação sistemática constitucional resultaria no reconhecimento de qualquer direito líquido e certo à nomeação dos aprovados. Por isso, alegou violação aos artigos 5º, inciso LXIX, e 37, caput e inciso IV, da Constituição Federal.
Quando a administração pública torna público um edital de concurso convocando todos os cidadãos a participarem da seleção para o preenchimento de determinadas vagas no serviço público, “ela, impreterivelmente, gera uma expectativa quanto ao seu comportamento segundo as regras previstas nesse edital”, uma vez que os cidadãos “depositam sua confiança no Estado-administrador”.
O ministro também abordou a relação do direito do aprovado versus direito do Poder Público. Ele lembrou que, dentro do prazo de validade do concurso, pode-se escolher o momento no qual será realizada a nomeação. No entanto, ficam vedadas disposições sobre a própria nomeação. Para Gilmar Mendes, a nomeação “passa a constituir um direito do concursando aprovado e, dessa forma, um dever imposto ao poder público”.
O direito à nomeação, salientou Mendes, surge quando se realizam as condições fáticas e jurídicas. Estão aí englobadas a previsão em edital de número específico de vagas a serem preenchidas pelos candidatos aprovados no concurso; realização do certame conforme as regras do edital; homologação do concurso; e proclamação dos aprovados dentro do número de vagas previstos no edital em ordem de classificação por ato inequívoco e público da autoridade administrativa competente.
Ao contrário do que alegava o estado de Mato Grosso do Sul, para o ministro a existência de um direito à nomeação limita a discricionariedade do poder público quanto à realização e gestão dos concursos públicos. “Respeitada a ordem de classificação, a discricionariedade da administração se resume ao momento da nomeação nos limites do prazo de validade do concurso, disse.
Apesar de todas as considerações, o ministro disse entender que as “situações excepcionalíssimas” não podem ser ignoradas, já que elas “podem exigir a recusa da administração de nomear novos servidores”. Isso ocorre quando uma situação apresenta superveniência, imprevisibilidade, gravidade e necessidade.
O ministro Marco Aurélio disse que “o Estado não pode brincar com cidadão. O concurso público não é o responsável pelas mazelas do Brasil, ao contrário, busca-se com o concurso público a lisura, o afastamento do apadrinhamento, do benefício, considerado o engajamento deste ou daquele cidadão e o enfoque igualitário, dando-se as mesmas condições àqueles que se disponham a disputar um cargo”.
A ministra Carmen Lúcia Antunes Rocha disse que não acredita em “uma democracia que não viva do princípio da confiança do cidadão na administração”. Já o ministro Celso de Mello considerou o julgamento como “a expressão deste itinerário jurisprudencial, que reforça, densifica e confere relevo necessário ao postulado constitucional do concurso público”.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 20 de agosto de 2011.
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