O Brasil vive o mais extenso período de democracia de todos os seus 512 anos
de vida. Já são pelo menos 24 anos sem qualquer ruptura no processo
político-juridico-eleitoral. Não se ignora as dificuldades em termos o Estado
atuando efetivamente a favor do cidadão. Quase como uma triste regra, o povo não
é o destinatário principal das ações estatais, o ente público tende a gerir-se
em torno dos seus próprios interesses, ou melhor, em favor dos que o integram ou
dos que com ele tem relações comerciais ou de interesse.
A corrupção, doença endêmica de difícil cura, continua a consumir milhões dos
cofres públicos. O aparelho estatal, que custa muito caro ao país, tem se
mostrado ineficaz no combate aos efeitos nocivos dessa nefasta realidade. Não
raras vezes a imprensa tem sido mais eficiente para descobrir casos de corrupção
do que os próprios órgãos de fiscalização.
Mas para que o pessimismo não nos consuma, é preciso reconhecer que a
sociedade avança em vários aspectos e mostra o vigor e a importância do sonhado
Estado Democrático de Direito. O Supremo Tribunal Federal (STF), em três
recentes decisões, tratou de temas relativos à sociedade, à democracia e ao
aprimoramento das instituições. A Ordem dos Advogados do Brasil, fazendo cumprir
as disposições de sua lei de regência (art. 44, Lei 8.906/94), teve atuação
decisiva nos três processos.
1º - Constitucionalidade do exame de Ordem.
Com expressa previsão legal, primeiro na lei 4.215/63 e depois na 8.906/94, o
exame tem sido combatido sob o argumento de que sua obrigatoriedade viola o
preceito constitucional que assegura a liberdade para o exercício das
profissões.
Entender a importância dos requisitos especiais de cada profissão foi a
premissa básica para a conclusão do STF acerca da constitucionalidade do exame.
Segundo o voto do relator, as profissões que representam riscos à coletividade
serão limitadas e exercidas somente por aqueles indivíduos conhecedores da
técnica. (Voto Min. Marco Aurélio, RE 603.5831 )
Por fim, o STF concluiu que o exame de Ordem serve perfeitamente ao propósito
de avaliar se estão presentes as condições mínimas para o exercício escorreito
da advocacia. A decisão, portanto, consubstancia sistema de proteção da própria
sociedade que tem o direito de ser atendida por profissionais capacitados.
2º - Constitucionalidade da Lei Ficha Limpa.
Utilizando-se de legitimidade outorgada pela Constituição Federal e
preocupada com a insegurança jurídica gerada por decisões que mitigavam a
aplicação da chamada Lei da Ficha Limpa, a OAB ajuizou Ação Declaratória de
Constitucionalidade em relação à Lei Complementar 135/2010, provocando
manifestação da Suprema Corte acerca da matéria.
A Lei, que nasceu por projeto de iniciativa popular, trazendo ao cenário
nacional inegáveis avanços e novos paradigmas, teve a sua constitucionalidade
reconhecida pela Suprema Corte, que destacou a necessidade de moralidade e
honestidade no exercício das funções públicas. Vitoriosa, portanto, toda a
sociedade que passa a contar com sistema legislativo depurador da política
nacional.
3º - Prerrogativas do CNJ.
Em seus poucos anos de existência, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
demonstrou ao país a amplitude e importância de sua atuação e, nessa
perspectiva, passou a incomodar interesses corporativistas que logo se arvoraram
em defender a ideia de que aquele órgão teria apenas competência subsidiária, ou
seja, poderia atuar apenas após a provocação das corregedorias estaduais. A tese
representava verdadeira volta ao passado, pois a notória pouca operância das
corregedorias estaduais foi exatamente um dos motivos a justificar a criação do
CNJ.
Nesse sentido, a OAB nacional ingressou como amicus curiae na Ação Direta de
Inconstitucionalidade 4.638, defendendo a competência originária e plena do CNJ,
nos termos do que está disciplinado pelo artigo 103-B da Constituição Federal,
tendo sido tal tese acolhida pela Suprema Corte.
A decisão do STF que ratifica os poderes do CNJ é decisão a ser comemorada
por todos. Ganha o país e a sociedade.
O que se extrai das três decisões do STF anteriormente referidas é a
importância que a sociedade organizada tem na solidificação da democracia e no
aperfeiçoamento do Estado de Direito.
O STF ao aplicar e interpretar a Constituição Federal não age como órgão
autômato e divorciado da realidade mas, em verdade, materializa a sua visão
ideológica da norma. Ideologia que, como bem lembra Norberto Bobbio, é “a
expressão do comportamento avaliativo que o homem assume face a uma realidade,
consistindo num juízo de valores relativos a tal realidade.”
Nesse mesmo passo, não remanesce qualquer dúvida de que o papel da OAB
definitivamente transcende os muros da entidade, porquanto sua atuação traz
reflexos para toda a sociedade. Foram três vitórias conquistadas em 2011 e 2012,
que expressam uma luta de décadas, evidenciando a indispensabilidade da atuação
da advocacia brasileira, como expressamente previsto em nossa carta de valores.
Alberto de Paula Machado, vice-presidente nacional da OAB.
Disponível em: http://www.gazetadopovo.com.br/vidapublica/justica-direito/artigos/conteudo.phtml?tl=1&id=1243464&tit=O-STF-a-OAB-e-tres-historicas-decisoes. Acesso em: 01 mai. 2012.
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