Criado através da Constituição Federal de 1988 e instalado no ano seguinte, o
Superior Tribunal de Justiça (STJ), conforme é cediço, tem a nobre missão de
uniformizar a interpretação das leis federais em todo o país, seguindo os
princípios constitucionais e a garantia e defesa do Estado de Direito.
Ocorre, porém, que passados mais de vinte anos da criação do tribunal, surgem
diversas indagações sobre o modo com que vêm sendo combatidos os recursos de
estrito direito, mormente após o pedido de implementação no Congresso Nacional
do instituto da “repercussão geral”.
Em 14 de março do corrente ano, o presidente do STJ, Ministro Ari Pargendler,
entregou ao Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, a Proposta de Emenda
Constitucional (PEC) que institui a repercussão geral no Superior Tribunal de
Justiça. Inclusive, para uma melhor visualização acerca do tema, podemos afirmar
que a repercussão geral é um instrumento processual inserido na Constituição
Federal de 1988, por meio da Emenda Constitucional 45, conhecida como a “reforma
do judiciário”. O objetivo desta ferramenta é possibilitar que o Supremo
Tribunal Federal (STF), por meio do plenário, selecione os recursos
extraordinários que irá analisar, de acordo com critérios de relevância
jurídica, política, social ou econômica.
Pois bem. Tal atitude causou diversas manifestações entre os profissionais do
Direito, mais especificamente entre os advogados, haja vista que estes acreditam
em uma tentativa de se frear de forma temerária o julgamento de recursos, os
quais, na maioria das vezes, são de suma importância para a concretização do
Estado Democrático de Direito.
A pergunta a ser feita no presente artigo é se o ato praticado pelo Egrégio
Superior Tribunal de Justiça, através de seu presidente, está apto a resolver os
problemas estruturais daquele tribunal. Não podemos esquecer que a constante
criação de súmulas – que por muitas vezes são dissonantes com a realidade social
– e recursos repetitivos (artigo 543-C, CPC) apenas filtraram parte dos
recursos, mas não trouxeram a tão sonhada razoável duração do processo (artigo
5º, LXXVIII, CF).
Ademais, a argumentação do ministro-presidente, ao declarar que o STJ não
deve julgar questões de baixa relevância (ex: multas de trânsito), não parece a
mais apropriada, ainda mais quando estamos diante de uma democracia que permite
a todo e qualquer cidadão a luta pelos seus direitos.
Parece-me lógico que a implementação da “repercussão geral” trará benefícios
por um curto período de tempo, sendo que em alguns anos novas propostas serão
remetidas ao Congresso Nacional na busca de uma maior “celeridade” e “justiça
processual”.
Veja-se, ainda, que o próprio projeto de novo Código de Processo Civil –
presidido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux, sob relatoria da
professora Teresa Arruda Alvim Wambier, e com versão definitiva entregue ao
Senado em 08 de junho de 2010 – foi elaborado com vistas à celeridade
processual, mas sem se atentar às efetivas necessidades dos profissionais do
Direito. Tanto é verdade que o projeto prevê o “incidente de resolução de
demandas repetitivas”; a exclusão do recurso de embargos infringentes; a
ausência de efeito suspensivo ao recurso de apelação; a irrecorribilidade da
maioria das decisões interlocutórias; porém, não se insere de forma definitiva
no processo eletrônico. Vejamos:
Projeto do novo CPC. “Art. 895. É admissível o incidente de demandas
repetitivas sempre que identificada controvérsia com potencial de gerar
relevante multiplicação de processos fundados em idêntica questão de direito e
de causar grave insegurança jurídica, decorrente do risco de coexistência de
decisões conflitantes”.
“Art. 908. Os recursos, salvo disposição legal em sentido diverso, não
impedem a eficácia da decisão”.
“Art. 929. Cabe agravo de instrumento contra decisões interlocutórias: I -
que versem sobre tutelas de urgência ou da evidência; II – que versarem sobre o
mérito da causa; III – proferidas na fase de cumprimento de sentença ou no
processo de execução; IV – em outros casos expressamente referidos neste Código
ou na lei. Parágrafo único. As questões resolvidas por outras decisões
interlocutórias proferidas antes da sentença não ficam acobertadas pela
preclusão, podendo ser impugnadas pela parte, em preliminar, nas razões ou
contrarrazões de apelação”.
É de se ressaltar, por derradeiro, que este artigo não possui o propósito de
criticar a elaboração de emendas constitucionais ou um novo Código de Processo
Civil, mas, sim, refletir se todo este trâmite está ocorrendo de forma
inteligente e democrática. Não devemos confundir celeridade com trancamento
injustificado de recursos.
Gilberto Andreassa Junior, advogado, professor universitário, mestrando em Direito, especialista em Direito Processual Civil Contemporâneo, membro efetivo do IAP, membro honorário da Academia Brasileira de Direito Processual Civil e membro da Comissão de Juizados Especiais da OAB-PR.
Disponível em: http://www.gazetadopovo.com.br/vidapublica/justica-direito/artigos/conteudo.phtml?tl=1&id=1248191&tit=O-STJ-e-sua-irracionalidade-juridica. Acesso em: 01 mai. 2012.
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