terça-feira, 1 de maio de 2012

O STJ e sua (ir)racionalidade jurídica

Criado através da Constituição Federal de 1988 e instalado no ano seguinte, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), conforme é cediço, tem a nobre missão de uniformizar a interpretação das leis federais em todo o país, seguindo os princípios constitucionais e a garantia e defesa do Estado de Direito.

Ocorre, porém, que passados mais de vinte anos da criação do tribunal, surgem diversas indagações sobre o modo com que vêm sendo combatidos os recursos de estrito direito, mormente após o pedido de implementação no Congresso Nacional do instituto da “repercussão geral”.
Em 14 de março do corrente ano, o presidente do STJ, Ministro Ari Pargendler, entregou ao Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que institui a repercussão geral no Superior Tribunal de Justiça. Inclusive, para uma melhor visualização acerca do tema, podemos afirmar que a repercussão geral é um instrumento processual inserido na Constituição Federal de 1988, por meio da Emenda Constitucional 45, conhecida como a “reforma do judiciário”. O objetivo desta ferramenta é possibilitar que o Supremo Tribunal Federal (STF), por meio do plenário, selecione os recursos extraordinários que irá analisar, de acordo com critérios de relevância jurídica, política, social ou econômica.
Pois bem. Tal atitude causou diversas manifestações entre os profissionais do Direito, mais especificamente entre os advogados, haja vista que estes acreditam em uma tentativa de se frear de forma temerária o julgamento de recursos, os quais, na maioria das vezes, são de suma importância para a concretização do Estado Democrático de Direito.
A pergunta a ser feita no presente artigo é se o ato praticado pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça, através de seu presidente, está apto a resolver os problemas estruturais daquele tribunal. Não podemos esquecer que a constante criação de súmulas – que por muitas vezes são dissonantes com a realidade social – e recursos repetitivos (artigo 543-C, CPC) apenas filtraram parte dos recursos, mas não trouxeram a tão sonhada razoável duração do processo (artigo 5º, LXXVIII, CF).
Ademais, a argumentação do ministro-presidente, ao declarar que o STJ não deve julgar questões de baixa relevância (ex: multas de trânsito), não parece a mais apropriada, ainda mais quando estamos diante de uma democracia que permite a todo e qualquer cidadão a luta pelos seus direitos.
Parece-me lógico que a implementação da “repercussão geral” trará benefícios por um curto período de tempo, sendo que em alguns anos novas propostas serão remetidas ao Congresso Nacional na busca de uma maior “celeridade” e “justiça processual”.
Veja-se, ainda, que o próprio projeto de novo Código de Processo Civil – presidido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux, sob relatoria da professora Teresa Arruda Alvim Wambier, e com versão definitiva entregue ao Senado em 08 de junho de 2010 – foi elaborado com vistas à celeridade processual, mas sem se atentar às efetivas necessidades dos profissionais do Direito. Tanto é verdade que o projeto prevê o “incidente de resolução de demandas repetitivas”; a exclusão do recurso de embargos infringentes; a ausência de efeito suspensivo ao recurso de apelação; a irrecorribilidade da maioria das decisões interlocutórias; porém, não se insere de forma definitiva no processo eletrônico. Vejamos:
Projeto do novo CPC. “Art. 895. É admissível o incidente de demandas repetitivas sempre que identificada controvérsia com potencial de gerar relevante multiplicação de processos fundados em idêntica questão de direito e de causar grave insegurança jurídica, decorrente do risco de coexistência de decisões conflitantes”.
Art. 908. Os recursos, salvo disposição legal em sentido diverso, não impedem a eficácia da decisão”.
“Art. 929. Cabe agravo de instrumento contra decisões interlocutórias: I - que versem sobre tutelas de urgência ou da evidência; II – que versarem sobre o mérito da causa; III – proferidas na fase de cumprimento de sentença ou no processo de execução; IV – em outros casos expressamente referidos neste Código ou na lei. Parágrafo único. As questões resolvidas por outras decisões interlocutórias proferidas antes da sentença não ficam acobertadas pela preclusão, podendo ser impugnadas pela parte, em preliminar, nas razões ou contrarrazões de apelação”.
É de se ressaltar, por derradeiro, que este artigo não possui o propósito de criticar a elaboração de emendas constitucionais ou um novo Código de Processo Civil, mas, sim, refletir se todo este trâmite está ocorrendo de forma inteligente e democrática. Não devemos confundir celeridade com trancamento injustificado de recursos.

Gilberto Andreassa Junior, advogado, professor universitário, mestrando em Direito, especialista em Direito Processual Civil Contemporâneo, membro efetivo do IAP, membro honorário da Academia Brasileira de Direito Processual Civil e membro da Comissão de Juizados Especiais da OAB-PR.



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